Estudantes criam absorvente biodegradável com fibra de bananeira e do açaí que custa R$ 0,02

Estudantes gaúchas do ensino médio desenvolveram um absorvente biodegradável com um custo de R$ 0,02. O projeto é um dos finalistas da Febrace (Feira Brasileira de Ciências e Engenharia), que segue até o próximo sábado (26). O protótipo foi desenvolvido com menos algodão, que foi substituído por dois resíduos da agroindústria: fibras da bananeira e do açaí. A ideia surgiu quando uma das alunas ficou sabendo que a própria mãe não teve acesso a absorventes na adolescência e que precisou recorrer a outros métodos durante seu ciclo menstrual.

Camily dos Santos e Laura Drebes, ambas de 18 anos, estudam no IFRS (Instituto Federal do Rio Grande do Sul), campus de Osório, cidade a 103km da capital Porto Alegre. Juntas, as estudantes pensaram em uma forma de ajudar mulheres em situação de vulnerabilidade, criando uma alternativa mais acessível para usar durante a menstruação.

Pobreza menstrual da mãe inspirou jovem

Camily contou que tudo começou quando teve uma conversa com a mãe sobre as alternativas ecológicas de absorventes higiênicos. Para a surpresa da jovem, a mulher revelou não ter tido acesso a absorventes convencionais na adolescência.

Essa foi a primeira vez que a estudante se deparou com o tema da pobreza menstrual, um problema que afeta milhares de mulheres ao redor do mundo.

“Jamais imaginaria que a questão estivesse tão próxima de mim. Assim, foi se formando a ideia da pesquisa. Comecei a me questionar se poderia haver um absorvente feminino que, além de ecológico, fosse acessível às mulheres em situação de vulnerabilidade. Procurei uma professora para contar sobre a minha ideia e convidá-la para ser orientadora e, nesse momento, Laura se juntou a nós, visto que ela já possuía experiência na área da pesquisa para o desenvolvimento de biofilmes”, explicou.

Laura Bredes vinha pesquisando e desenvolvendo um projeto envolvendo o aproveitamento de resíduos industriais para a elaboração de filmes plásticos biodegradáveis. Ao saber da ideia de Camily, resolveu integrar a equipe.

O projeto consistia em confeccionar um produto formado por diferentes camadas. A pesquisa buscou substitutos do algodão para a camada absorvente. Nessa etapa, as estudantes verificaram que fibras vegetais são boas substâncias de absorção e que, para baratear ainda mais, poderiam usar materiais disponíveis na região.

As fibras do pseudocaule da bananeira —parte da árvore que é retirada após a colheita dos cachos de banana— e as fibras do açaí de juçara —parte que sobra do processo de obtenção da polpa do açaí— foram as escolhidas.

“Para a camada debiofilme que substitui o plástico, testamos os subprodutos provenientes do processamento de fármacos da indústria nutracêutica [substância considerada alimento que pode ter benefícios médicos e de saúde]. Por último, confeccionamos o nosso invólucro de tecido disponibilizado por costureiras da nossa região. Para selecionar o tecido mais adequado, testamos 13 tipos diferentes “, continuou Camily.

Na camada absorvente composta por fibras vegetais para substituir o algodão, os testes de capacidade absortiva verificaram uma eficiência 60% maior do que os produtos já comercializados.

Flavia Twardowski, diretora geral do campus Osório do IFRS e orientadora do projeto, explicou que o valor de R$ 0,02 foi calculado a partir do método de custeio por absorção. O valor ficou muito barato mesmo sendo calculado em escala laboratorial, pois os materiais eram todos de descarte.

“Não pensamos ainda no processo de patente pois estamos melhorando o nosso protótipo final. Pensamos em levar os absorventes à nossa comunidade por meio de uma cooperativa de mulheres de forma a promover o pertencimento delas, atendendo a uma necessidade da população”, ressaltou a orientadora.

Além da distribuição em comunidades, acrescentou a professora, o IFRS está em contato com a prefeitura de Osório para entender qual é o tamanho da população que necessita ser atendida. Para tanto, o CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais) foi acionado, e a equipe já está mapeando esse número.

“Orientar Camily e Laura foi um presente que a pandemia me trouxe. Elas chegaram a mim com uma vontade imensa de fazer ciência e resolver um problema que as incomodava. Durante todo o processo, foram incansáveis e um exemplo de que meninas também fazem ciência. O projeto foi desenvolvido quando a escola estava fechada para aulas, e elas vinham dia após dia realizar experimentos depois de suas aulas remotas”, contou a docente.

Para a estudante Laura Bredes, a necessidade e a importância em proporcionar uma maior acessibilidade de absorventes estão principalmente relacionadas com os direitos humanos, já que os produtos são indispensáveis para a qualidade de vida das mulheres.

“A situação da pobreza menstrual é muito grave: consiste na falta de acesso à infraestrutura, de informações acerca da menstruação e de materiais básicos de higiene. Isso faz com que milhares de mulheres utilizem materiais improvisados, como pedaços de tecido, jornal, sacolas plásticas e até mesmo miolo de pão. Isso as coloca em um dilema entre comer ou estancar o fluxo durante o período”, destacou.

A jovem cientista aponta que, em média, as mulheres descartam dez mil absorventes durante suas vidas, e que esses produtos demoram entre 100 e 500 anos para se decompor na natureza, em razão de seus componentes plásticos e aditivos químicos. Por isso, existe a necessidade imperativa de alternativas biodegradáveis.

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