
Funcionário alega ter sido demitido por se recusar a participar de culto religioso em empresa
Um funcionário denunciou que foi demitido após se recusar a participar de um culto religioso em uma empresa de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Um vídeo gravado pelo próprio trabalhador — que não teve a identidade divulgada — está circulando nas redes sociais e mostra a discussão com o presidente da Loovi Seguros, o CEO Quézide Cunha.
No vídeo, o funcionário relata que não poderia participar do culto naquele momento, pois “não estava se sentindo bem”. Em seguida, o empresário aparece e responde: “Se você não está bem para ficar num culto, você não está bem nem para estar dentro da empresa”, rebateu Cunha.
Após o desentendimento, o trabalhador subiu as escadas para sair do local e comentou com outra pessoa que havia sido demitido pelo empresário. “Me mandou embora. Estou demitido porque eu não quero participar do culto”.
Por meio de nota, a empresa se manifestou e afirmou que “a dispensa do colaborador não tem relação com intolerância religiosa”. Ainda segundo a Loovi Seguros, o vídeo foi “gravado sem contexto adequado e divulgado para prejudicar a reputação da empresa”.
A discussão entre o funcionário e o empresário aconteceu no dia 27 de janeiro, mas só teve repercussão neste fim de semana, quando viralizou nas redes sociais, principalmente em posts do X que somam milhares de visualizações. O caso foi compartilhado por vários perfis na rede social e causou revolta entre os internautas. “Absurdo! A pessoa ser coagida a frequentar o culto”, escreveu um. “Assédio moral e desacordo com as leis trabalhistas”, comentou outra.
O caso foi encaminhado ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e denunciado ao Ministério Público do Trabalho (MPT). Ainda de acordo com a publicação, a defesa do funcionário alega que a empresa possui uma cultura organizacional impositiva, obrigando práticas religiosas no ambiente de trabalho, incluindo a interrupção das atividades para a participação em cultos às segundas-feiras.
A primeira audiência entre o funcionário e o empresário está prevista para acontecer em março. O processo judicial corre sob sigilo de Justiça, ficando restrito às partes e respectivos procuradores.
A empresa pode impor práticas religiosas?
A advogada Carolina Heim, que é especialista em Direito e Processo do Trabalho e sócia do escritório Ruy Andrade Advocacia, explica que a empresa não pode obrigar e nem demitir o funcionário que recuse participar de cultos religiosos no ambiente de trabalho, uma vez que a liberdade religiosa é considerada um direito fundamental. Isso porque a Constituição Federal do Brasil determina que ninguém pode ser privado de direitos por causa da sua crença religiosa.
Caso haja a imposição da prática religiosa pela empresa, o funcionário pode reunir provas e realizar uma denúncia nos órgãos competentes. “O ideal é que ele consiga provas de que esse empregador está fazendo essa exigência ilegal. Seja uma gravação, como esse funcionário fez, ou algum outro tipo de prova, como um e-mail, ou até uma testemunha. Caso realmente fique provado que a demissão se deu por esse motivo ou qualquer outra forma de discriminação, ele pode buscar os direitos dele na Justiça do Trabalho ou fazer uma denúncia no Ministério Público do Trabalho”, pontua.
Além disso, a especialista destaca que o funcionário não pode sofrer nenhum tipo de discriminação por praticar qualquer tipo de religião. “O trabalhador não pode sofrer uma diferença na hora da promoção, não pode deixar de ser admitido por conta da sua religião e não pode ter um rebaixamento de função por esse motivo, por exemplo.”
O professor de Direito da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro, Paulo Renato Fernandes, corrobora que a demissão por imposição de prática religiosa na empresa é ilegal e aponta que a empresa pode sofrer consequências jurídicas, como o pagamento de indenização ao funcionário por danos ou assédio moral.
“O empregado pode reivindicar uma indenização por danos morais, uma vez que isso aflige a dignidade dele e a liberdade religiosa é um direito fundamental assegurado pela Constituição. Ele pode pedir até mesmo a anulação da demissão, se ela for discriminatória”, acrescenta.