INVESTIGAÇÃO: Mulher de Queiroz tinha contatos de Bolsonaro guardado em caderno
Ao pedir a prisão preventiva de Fabrício Queiroz, o Ministério Público do Rio citou três contatos que, anotados à mão numa caderneta, poderiam ajudar a família quando o ex-assessor de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) fosse detido. O material apreendido com a mulher dele em dezembro do ano passado, no entanto, não se limita a isso. Segundo imagens às quais o Estadão teve acesso, Márcia Oliveira de Aguiar tinha nessa agenda-guia números de celulares atribuídos ao presidente Jair Bolsonaro, ao próprio Flávio, à primeira-dama, Michelle, e a diversas pessoas ligadas à família, além de contatos e anotações sobre policiais, pessoas envolvidas com a milícia e políticos do Rio.
O nome de Queiroz veio à tona em dezembro de 2018, quando o Estadão revelou movimentações financeiras atípicas na conta do ex-assessor.
No pedido de prisão preventiva, a Promotoria mencionou apenas três nomes que poderiam favorecer Queiroz. Mas, no material bruto, há também contatos com comentários que também indicam orientações do marido enquanto estava escondido. Outros – como os telefones atribuídos a Bolsonaro, Flávio e Michelle – não vêm acompanhados de anotações.
A família presidencial compõe parte significativa dos papéis. Numa mesma folha, dois números de Jair e um de Michelle aparecem juntos; noutra, um celular de Flávio e um de sua mulher, Fernanda. Há ainda o contato de Max Guilherme Machado de Moura, ex-segurança e hoje assessor especial do presidente, além do sócio de Flávio na loja de chocolate investigada por suposta lavagem de dinheiro, Alexandre Santini.
Bolsonaro não é – e nem poderia ser, por causa do foro especial – investigado pelo Ministério Público do Rio. Também não há indícios, nas conversas de Márcia no período investigado, de que tenha havido alguma troca de mensagem entre a mulher de Queiroz e o presidente e seus parentes.
Não é possível saber a data exata das anotações, já que eram feitas à mão, mas algumas indicações deixam claro que foram escritas depois da eleição de 2018. Políticos em primeiro mandato na atual legislatura já apareciam ali identificados pelos seus respectivos cargos. É o caso dos deputados estaduais Rodrigo Amorim (PSL) e Marcelo do Seu Dino (PSL), o federal Lourival Gomes (PSL-RJ) e o segundo suplente de Flávio no Senado, Léo Rodrigues, hoje secretário de Ciência e Tecnologia do governo Wilson Witzel (PSC).
Entre os contatos, há um coronel identificado como amigo de Queiroz e “braço direito do Bração (sic)”, uma possível referência a Domingos Brazão, ex-deputado e conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado por suspeitas de corrupção, ou um de seus irmãos – os deputados Pedro e Chiquinho.
O caderno também tem contatos de pessoas ligadas a Adriano Magalhães da Nóbrega, o Capitão Adriano – que, segundo o MP, se beneficiava da “rachadinha” no gabinete de Flávio – morto em fevereiro. Raimunda, a mãe de Adriano que teve cargo no gabinete de Flávio e também é investigada, mantinha conversas com Márcia, de quem é amiga. Alguns trechos indicam que havia coordenação entre interlocutores de Adriano, então foragido da Justiça desde janeiro de 2019, e de Flávio e Queiroz.
Outra pessoa ligada a Adriano é uma mulher identificada como Andreia, que seria amiga de Raimunda e tem, sob seu nome, a seguinte anotação: “fazer deposto (sic) na conta do Queiroz”. Segundo as investigações, “deposto” seria “depósito”. Outro pequeno caderno apreendido traz anotações sobre o dinheiro em espécie usado para pagar o tratamento de Queiroz no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Márcia teria recebido R$ 174 mil para as despesas.
Defesa
O deputado Rodrigo Amorim, conhecido na eleição por quebrar a placa de Marielle Franco, afirmou que conheceu Queiroz em 2016, quando foi candidato a vice-prefeito na chapa de Flávio Bolsonaro. “Sempre o vi como um militante aguerrido, um cara que gostava de trabalhar na rua, de abordar o eleitor. Agora, se ele cometeu erros, que responda, dentro da lei e com a ampla defesa a que tem direito.”
Léo Rodrigues afirmou que conhece Queiroz porque fizeram campanha juntos, mas que desconhece a existência da agenda de Márcia. “Até o momento ninguém fez contato comigo, mas não me oporia em ajudá-lo caso precisasse, sempre de forma lícita e republicana.”
O senador Flávio Bolsonaro, o presidente e a primeira-dama foram procurados, mas até a conclusão desta reportagem não deram resposta. O Estadão não conseguiu contato com os deputados Marcelo do Seu Dino e Lourival Gomes; a família Brazão não respondeu.