Máscaras serão necessárias por mais dois ou três anos, diz cientista da Sinovac

A variante ômicron da covid-19 e sua alta capacidade de transmissão surpreenderam cientistas, que no início da pandemia não contavam com a rápida mutação do vírus. Segundo o diretor médico da Sinovac, Zijie Zhang, que está no Brasil há três meses trabalhando dentro do Instituto Butantan em razão da parceria da farmacêutica chinês com o governo do Estado de São Paulo, a nova cepa impõe desafios aos laboratórios e sinaliza que a pandemia pode ainda não estar tão perto do fim.

“Acredito que teremos que usar máscaras, no mínimo, por pelos menos mais dois anos, talvez três”, disse Zhang em entrevista ao Valor no Instituto Butantan, ressaltando que outras medidas mais restritivas dependerão mais da gravidade de cada momento e das decisões de cada país. “Precisamos que a população tome os reforços. Veja, no continente africano somente 10% das pessoas tomaram a vacina. E mesmo nos EUA menos de 40% tomaram as doses de reforço. A melhor maneira de reduzir a transmissão é tomando o reforço”, afirma. “Se duas doses protegem por seis meses, talvez o reforço possa proteger por um ano. É o que estamos estudando.” 

O cientista da Sinovac diz que as primeiras doses das vacinas, tanto a Coronavac, fabricada pela farmacêutica chinesa, quanto as demais, possivelmente são menos eficazes contra a ômicron do que eram diante das outras cepas. Contudo, isso não reduz a necessidade de que a população tome as doses de reforço. Pelo contrário, pois os laboratórios têm se dedicado a atualizar os antídotos. Zijie afirma que, quando a variante delta começou a se disseminar, os laboratórios já começaram a considerar os novos dados, mas reconhece que a ômicron aumentou a complexidade do trabalho.

“Nós também desenvolvemos vacina para a delta. Mas, baseados em resultados ao redor do mundo, vimos que as vacinas ainda desempenham um bom trabalho contra aquela variante. A taxa de proteção era muito similar entre a vacina desenvolvida para a delta e as outras era similar. Em termos de proteção vacinal, a delta não era tão perigosa”, disse Zijie. “Já a ômicron possui mais mutações e pode reduzir rapidamente os anticorpos das vacinas. É por isso que essa variante pode ser mais problemática que as anteriores”, explica. Veja a seguir os principais pontos da entrevista.

Vacinação constante – Por causa das mutações do vírus, Zijie prevê que deverá haver uma campanha permanente de vacinação contra o coronavírus, assim como ocorre com a gripe. “Nós observamos que a presença do nível de anticorpos vai minguando ao longo do tempo. Isso obviamente compromete a efetividade da vacina à medida que o tempo passa. E ainda há o fator das variantes continuarem surgindo. Se o vírus muda, como acontece com o influenza, nós temos que ir mudando a vacina também porque as anteriores começam a não funcionar.”

Ele reitera que o surgimento da ômicron mudou o entendimento sobre o vírus. “Um mês atrás, achávamos que o vírus da covid-19 não mudaria tanto comparado ao influenza. No entanto, em quase dois anos vimos tantas variantes, especialmente a ômicron, e agora esperamos que mais cepas continuarão aparecendo.”

Zijie diz que tende a concordar com outros cientistas que já afirmam que vacinas contra a covid poderão passar a ser aplicadas simultaneamente ao imunizante da gripe. No Reino Unido, por exemplo, um estudo iniciado no meio do ano e liderado por pesquisadores do Sistema Nacional de Saúde (NHS, na sigla em inglês), similar ao SUS no Brasil, já analisa quais efeitos colaterais as pessoas obtêm quando recebem a vacina contra a gripe e a vacina da AstraZeneca e da Pfizer ao mesmo tempo. Além disso, investigam a consistência da resposta imunológica do organismo para cada dose.

Letalidade – Embora acredite que novas variantes surgirão e que protocolos da pandemia terão que ser, em maior ou menor medida, estendidos até 2023, pelos menos, o cientista chinês pondera que a tendência é ver o vírus se tornando cada vez menos letal. “Essa é a boa notícia”, disse. “Mesmo que as vacinas não consigam deter as transmissões, o mais importante é que podemos reduzir a gravidade da doença e as pessoas não precisarão ter mais tanto medo dela”.

Coronavac Pfizer – Em resposta à desconfiança de parte da população em relação à Coronavac, vista mais no início da campanha quando pessoas buscavam postos de saúde com vacinas da Pfizer ou da Janssen, Zijie diz que científica e estatisticamente já há provas suficientes de que o imunizante da Sinovac funciona e não gera efeitos colaterais maquiavélicos.

“Quase 2 bilhões de pessoas tomaram as nossas vacinas. Nós temos um sistema de vigilância sanitária que nos deixa muito confiantes sobre a segurança do nosso imunizante. Pode não ter sido totalmente eficaz em interromper as transmissões da doença, mas salvaram muitas vidas. Nossa vacina atingiu altas taxas de proteção que evitaram infecções mais severas.”

Vacinação no Brasil – Em relação ao Brasil, o diretor médico da Sinovac disse que está impressionado com a alta adesão da população às vacinas. “Antes da covid-19, eu não estava familiarizado com o Brasil em termos de aceitação do público a vacinas. Mas o país mostrou uma boa base de promoção da vacinação. Em geral, é difícil ver essa alta taxa de aceitação”, comentou. Isso a despeito das políticas conflituosas do governo [federal] brasileiro. Ainda assim as pessoas aceitaram e identificamos uma cobertura vacinal muito alta”.

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